Direito Ambiental Internacional – O Princípio das Responsabilidades Comuns, porém Diferenciadas

Direito Ambiental Internacional – O Princípio das Responsabilidades Comuns, porém Diferenciadas

Direito Ambiental Internacional – O Princípio das Responsabilidades Comuns, porém Diferenciadas

 

POR LÍVIA GAIGHER BÓSIO CAMPELLO E VLADMIR SILVEIRA

Revista Jurídica Consulex

Há 20 anos, a cidade do Rio de Janeiro recebia líderes mundiais para discutir a relação entre meio ambiente e desenvolvimento e as metas para alcançar a complicada harmonização entre estas duas vertentes. O foco dos debates estava  no conceito de desenvolvimento sustentável, pelo qual se vislumbra satisfazer as necessidades das gerações atuais, comprometer a capaCidade das futuras gerações em satisfazer suas próprias necessidades.

Nesse emblemático  encontro em que houve participação numerosa das partes interessadas, as responsabilidades quanto às questões sociais· e ambientais foram formalmente compartilhadas entre as nações em vários documentos importantes: a Declaração de Princípios para o desenvolvimento sustentável das florestas, a Convenção -Quadro sobre Mudança do Clima  e a Convenção para o Combate à Desertificação.

Esses documentos que brotaram da Conferência das Nações Unidas para o Meio  Ambiente (CNUMAD) conhecida como “Cúpula da Terra”, estabelecimento de princípios e normas gerais que se tornaram paradigmas norteadores das legislações ambientais pelo mundo, levando o meio ambiente a alcançar, em definitivo, a agenda internacional.

O princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, consagrado na Rio 92, determina que os países desenvolvidos devem arcar com os custos maiores para o desenvolvimento sustentável. Tal postulado está em perfeita sintonia com o já consolidado princípio da igualdade, pelo qual se deve dar tratamento desigual aos desiguais com o intuito de igualá-los a partir de uma lógica material.

Antes da Conferência, em 1989, a ONU já havia sinalizado para o aduzido princípio.  Assim, de acordo com a Resolução no 44/228 da Assembleia Geral,  a responsabilidade de controlar, reduzir e eliminar as agressões ao meio ambiente compete aos países que as causam, guardadas as proporções com os danos causados e as respectivas capacidades.

São muitos os documentos internacionais que contemplam o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, particularmente ao. indicarem diferentes obrigações para as partes de acordo com suas possibilidades econômicas e sociais.

Dentre eles, merece destaque, sem dúvida,  a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, em cujo Preâmbulo se reconhece que a maior parte das emissões globais atuais e históricas dos gases de efeito estufa teve origem em países desenvolvidos.

Nesse sentido a Convenção requer: “A mais ampla cooperação possível entre todos os países e a sua participação em uma· resposta internacional eficaz e apropriada, de acordo com as suas responsabilidades comuns mas diferenciadas e de acordo com as suas capacidades respectivas e com as suas condições sociais e econômicas”.

Firmado em 1997 e em vigor desde feverejro de 2005, o Protocolo de Quioto confirmou o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas, pragmaticamente, ao reservar aos países não destacados no Anexo I; países em desenvolvimento, o direito de alcançarem o desenvolvimento sustentável sem necessariamente adotarem as metas compulsórias para a redução de emissões de gases de efeito estufa.

Em contrapartida, os países desenvolvidos (Partes do Anexo I) comprometeram-se a reduzir suas emissões totais de seis dos gases de efeito estufa em uma média de 5,2% abaixo dos níveis de 1990, no período compreendido entre 2008 e 2012, com metas diferenciadas para a grande maioria desses Estados.

Mas os compromissos de Quioto ainda não foram atingidos, apesar dos esforços de alguns países. Dez anos após a Rio 92, a ONU promoveu, em Joanesburgo, uma nova Conferência que ficou conhecida como Rio+10.

Às vésperas do evento, a ONU surpreendeu o mundo com o relatório Desafios globais, oportunidades globais, por meio do qual apresentou dados alarmantes sobre os desafios que o planeta enfrentava em 2002. O clima era desestimulante e o espírito de acordo e cooperação que estava presente na Rio 92 transformou-se em apatia política, descaso e regressão quanto às responsabilidades assumidas anteriormente.

Os Estados Unidos, por  exemplo, que tinham assumido a metade destinar O, 7% do seu PIB para os países em desenvolvimento, em 1992 destinava apenas 0,2% e, em 2002, havia diminuído ainda mais esse aparte para 0,1 %. Passados mais 10 anos, diante da Rio+20, novamente Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada em junho último, continua evidente que estamos perdendo o timing  para tomar decisões práticas e superar o desafio da implementação dos instrumentos de proteção ambiental já acordados nas Conferências anteriores.

Nesse sentido, há um’nftido clamor social e entre renomados juristas para que seja respeitada a proibição do retrocesso ambiental pelas nações quanto à  realização dos compromissos já adotados perante o mundo.

A despeito disso, o Processo de negociação do documento final O futuro que queremos,  na Rio+ 20, ficou marcado por desavenças quanto ao princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas.

Os países em desenvolvimento fizeram questão de reafirmá-lo expressamente no texto, enquanto que delegações como Estados Unidos, União Europeia, Japão e Canadá pressionaram para que o princípio não constasse novamente no documento final.

O negociador-chefe dos EUA na Rio+20, Todd Stern, expressou seu descontentamento com a manutenção do princípio lembrando em seu discurso que, na realidade, o sucesso dos países emergeptes também é devido à  utilização de seus próprios recursos domésticos.

Os países ricos conseguiram barrar a intenção do G77, grupo das nações em desenvolvimento, de criar,  na Rio+20, um fundo de 30 bilhões dedólares a ser destinado aos programas sustentáveis destes países. Do mesmo modo, absurdamente esquivaram-se do compromisso de transferir tecnologias para as nações em desenvolvimento.

O que dizer sobre a proposital perda da chance de renegociar os comjÍiomissos do Protocolo de Quioto, tema que não fez parte da agenda da Conferência?

Nesse aspecto, aguardamos um novo marco legal do clima com metas  a serem definidas em 2015, para vigorarem apenas a partir de 2020.

Enfim,  apesar da luta engendrada por Chefes de Estado, juristas e movimentos sociais do meio ambiente, o texto da Rio+20 limita-se a enfatizar a importância das  variadas fontes de financiamento e do fundamental acesso às tecnologias já disponíveis para implementação das medidas de proteção ambiental.

Como ponto positivo, a transferência das maiores responsabilidades ambientais aospaises ricos ficou mantida no texto final da Rio+20. No entanto, as incertezas que pairam sobre o futuro, especialmente em razão da crise financeira, e as diferentes visões acerca dos instrumentos de proteção ambiental, fizeram com que a tão aguardada promessa de financiamento por parte dos países ricos para aqueles em desenvolvimento e, nesse sentido, o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, estivessem. longe de se materializar na prática.

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